segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Homenagem a Luiz Emygdio no Conselho Estadual de Cultura do Rio de Janeiro

26/06/2002

É para mim uma honra muito grande ter sido convidado para falar na seção solene desta casa em homenagem a tão ilustre amigo, seu presidente.
Não sei se estou à altura da empreitada, mas gostaria de lembrar três episódios que ilustram a personalidade do professor Luiz Emygdio, certo de que todos terão histórias equivalentes, pois sua vida foi pródiga em passagens marcantes que evidenciavam seus grandes caráter, sabedoria e inteligência.

Numa das muitas excursões de Roberto Burle Marx para estudo e coleta de plantas em ecossistemas brasileiros intocados de que participou, sempre distribuindo o saber com brilho e generosidade, deparou-se num determinado ponto com plantas que para ele eram interessantíssimas pelo ineditismo, talvez, mas que não tinham tanta significação em termos paisagísticos. Roberto, como de costume, não tinha tempo a perder com aquele “capinzal de quinta ordem” e instava todos a prosseguirem na expedição, mas Luiz Emygdio o conteve:
“— Calma Roberto, que eu agora estou em pleno êxtase botânico.”
Freqüentemente citei esta passagem para meus alunos, pois demonstra que o conhecimento ilumina, a cultura entusiasma e o amor pelos dois transforma em palco de beleza mesmo cenários aparentemente desinteressantes para quem passa sem se aprofundar.

A companhia do professor sempre foi intensamente valiosa e agradável. Seus comentários não eram simplesmente técnicos ou acadêmicos. Ele sabia despertar o interesse com aspectos curiosos de cada planta para nós, o comum dos mortais.

Sua participação desde o primeiro instante no Conselho do Sítio Roberto Burle Marx foi de valor inexcedível. Enriqueceu-o com indicações de novos conselheiros, altamente qualificados, como o doutor Ubiratan Corrêa e o professor Ernani Diaz.

Com seu espírito desassombrado, era um grande aliado naquilo que eu chamo de luta pelo esclarecimento do que é conservar um jardim tombado — assunto larga e teimosamente incompreendido pelos idólatras, em geral histéricos, da paisagem congelada.

Numa dessas reuniões, diante da peroração preciosista, pedante e burocrática de uma participante, defensora da idéia equivocada de preservação do Sítio como se inanimada obra de arquitetura fosse, sussurrou-me demonstrando sua fleugma e bom humor:
“— Bizâncio tinha que cair.”

Outra atitude, a meu ver emblemática, foi o ensinamento a um dos jardineiros que estava preocupado contando os minutos que faltavam para a própria aposentadoria:
“— Não queira se aposentar, isto é um perigo. Eu nunca quis isso para mim.”

Tenho pena de que ele não tenha visto pronto o caminho já quase por abrir à visitação que passa no Sítio Roberto Burle Marx pela coleção de uma de suas famílias favoritas — as Helicônias.

A única planta que Roberto Burle Marx classificou foi a Heliconia emygdiana e a escolha desse nome revela o apreço de nosso saudoso mestre a este outro saudoso mestre. Certamente estarão trocando considerações sobre a botânica celestial nos jardins do paraíso.

O teatrólogo Nelson Rodrigues disse a um amigo que, passados 20 anos da morte do pai, confessava não ter ainda se recuperado:
“— Não se recupere nunca.”
Acredito que a mesma sugestão terá que ser seguida pelo Conselho do Sítio Roberto Burle Marx.

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