25/10/2001
O Sítio Roberto Burle Marx é uma entidade sui generis. Enquadra-se nas modernas e abrangentes definições de museu, de jardim botânico ou de centro de estudos, mas, por isso mesmo, escapa de todas elas.
O Sítio -- não vejo necessidade de enquadrá-lo -- é o Sítio e dentre os museus, jardins botânicos e centros de estudos que conheço ou tenho notícia, é ele que mais explicitamente une Arte e Natureza.
Seu principal acervo é o que podemos denominar botânico-paisagístico. Ou seja: aliada aos critérios técnicos e científicos, o elenco e a disposição das plantas aqui busca alcançar também resultados estéticos.
Entretanto, não sem modéstia, dizia Roberto: “Eu, que fiz jardins para tantos, não tenho um. O Sítio é o lugar de minhas experiências em paisagismo.”
E, para fazê-las, cedo precisou dos ingredientes que entusiasmadamente iria colecionar pelo resto da vida. Bastava a noticia de algum lugar de flora intocada para imediatamente começar a traçar um roteiro, convidar amigos (sempre um botânico incluído), selecionar um time de jardineiros do Sítio e agendar a saída do caminhão.
Foram muitas dessas excursões a levar o olhar amoroso e implacável de sua equipe aos ecossistemas mais belos e preservados do Brasil para descobrir e coletar. Algo inviável hoje pela burocracia que atualmente é exigida, mas que sem dúvida foi tremendamente benéfico para a cultura de nosso país e para o meio ambiente de maneira geral.
Observar as plantas nos seus habitats e nas suas associações originais foi a lição que Roberto jamais se cansou de receber da Natureza e de retransmitir aos interessados que o rodeavam.
O resultado quantitativo disso é que hoje temos, além da coleção do Sítio, mais ou menos oitenta plantas em cuja descrição científica Roberto figura como primeiro coletor, cerca de vinte espécies e um gênero homenageando seu nome e a brutal ampliação do vocabulário vegetal utilizado nos jardins de nossas latitudes por todos os paisagistas.
Por ter encontrado, além de plantas, muita devastação por onde passou, um revoltado Roberto Burle Marx tornou-se defensor do meio ambiente. Isso bem antes da palavra ecologia entrar em voga. Em pronunciamentos contundentes de entrevistas e de inúmeras conferências realizadas, afirmava que conservando a Natureza, como um repositório de beleza e diversidade, podemos conferir um sentido mais elevado a nossas próprias vidas.
Para que suas plantas e o resultado das experiências não se perdessem, doou o Sítio em 1985 à então Fundação Nacional Pró Memória, hoje Instituto do Patrimônio Artístico Nacional, que o mantém desde então e o tombou em 10 de agosto de 2000.
“Percorrer o Sítio é sempre uma experiência gratificante, mesmo para o leigo. Os diversos ambientes que se sucedem, as florações alternadas durante as estações, o prazer de assistir aos diversos momentos de brotação, crescimento e frutificação das plantas são fatores que trazem inúmeros visitantes a percorrê-lo. A ordenação dos diversos elementos tem caráter didático, aliado a uma preocupação estética”. Estas palavras foram extraídas de uma de suas conferência, mas a mensagem não verbal que ele deixou é mais incisiva e não poupa ninguém. Embora muitas vezes não saibam explicar, os visitantes a sentem sob forma de encantamento.
Disse o filósofo Francis Bacon:”Fazer jardins é o mais puro dos prazeres humanos.”
Mas fazer da Natureza matéria prima da Arte, como fez nosso saudoso mestre, é algo mais. É, além de tudo, conscientizar pela demonstração do que é alcançável pelo homem e arrastar legiões com o exemplo de um que tratou seu habitat de maneira inteligente, respeitosa e apaixonada, aumentando com isso as probabilidades de que as gerações futuras possam, também, usufruir da beleza e, mesmo, da habitabilidade deste planeta.
domingo, 8 de fevereiro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário