4/8/2000
O escritor, historiador, político ativo e teórico, membro da Academia Francesa, senador, oito vezes ministro, Alain Peyrefitte, em sua obra “A Sociedade de Confiança”, afirma que existe forte correlação entre a prosperidade de um povo e o grau de confiança que permeia seus indivíduos.
Com efeito, nada se faz em sociedade sem ter por base esta espécie de fé no semelhante. Quanto esforço, formalidade e burocracia são poupados, e quantas perspectivas novas se abrem, quando existe confiança!
Creio que Roberto Burle Marx, sua obra e colaboradores são um exemplo que corrobora essa tese.
Sem falar em qualidade, é impressionante a quantidade de coisas, materiais e imateriais, que Roberto deixou: jardins, plantas, pinturas, lutas, projetos, painéis, ensinamentos, tapeçarias, conferências, esculturas, desenhos, frases, etc. Entretanto, no meio disso tudo, ele nunca perdeu oportunidade de repetir que sua maior riqueza eram os amigos:”— Se eu não sei fazer ou não conheço uma coisa, um amigo meu sabe.”
E Roberto Burle Marx confiava plenamente nas pessoas. Dentre suas esplêndidas qualidades, esta, ao meu ver, é a que mais o distinguia, embora outras, como a generosidade, o talento múltiplo, a honestidade intelectual e o espírito, fossem bem mais conspícuas. Penso que, talvez, ele só tenha conseguido criar o Sítio e, por extensão, sua obra paisagística por causa da grande confiança que depositava nos amigos e, por extensão, no ser humano. Cabe repetir um exemplo eloqüente, que possibilitou a perpetuação de sua mais importante obra: quando José Tabacow e eu propusemos doar seu sítio à Fundação Pró Memória, ele disse apenas: “— Façam como acharem melhor”. E estou certo de que cada um, qualquer um, dos que trabalharam com ele pode lembrar de uma história de confiança equivalente.
Seus inúmeros colaboradores, emocionalmente tocados pelo incomum teor de confiança recebido, sentiam-se agraciados com algo muito valioso e procuravam retribuir, geralmente, com o melhor deles próprios. Desencadeavam-se, então, colaborações intensas que Roberto dirigia, orientava, tecia, orquestrava, sem se colocar em plano superior. Alguém, cujo nome não lembro, disse que Shakespeare se parecia com todos os homens, menos pelo fato de se parecer com todos os homens. Pois Roberto demonstrava estar no mesmo nível de seus parceiros, menos pelo fato de se colocar no nível de cada um.
Foi esta qualidade, formidável (como o “óbvio ululante” de Nelson Rodrigues) e, por isto mesmo, (pelo menos, até agora, para mim) invisível, que moveu os ânimos de quantos se acercaram do mestre, estabeleceu um ambiente de trabalho fascinante e tornou possível tantas realizações belas, importantes e fundamentais.
Não é demais relembrar, por ocasião do aniversário de sua morte, que a confiança no próximo, essa capacidade de pular no escuro, esse desprendimento, essa coragem, essa fé, era, também e muito, o nosso Roberto Burle Marx.
quarta-feira, 11 de março de 2009
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